O papel dos hormônios na disfunção sexual feminina
A disfunção sexual que acomete as mulheres representa uma questão importante de saúde pública, pois atingem cerca de 40% da população feminina. A sexualidade está oficialmente, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), entre os critérios que avaliam a qualidade de vida do cidadão. Portanto, problemas sexuais influenciam no bem-estar do indivíduo.
A ginecologista e obstetra Flávia Fairbanks Lima de Oliveira Marino, membro da Comissão Nacional Especializada de Sexologia da FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), fala sobre o tema e explica o papel dos hormônios e dos neurotransmissores na questão da disfunção sexual feminina, inclusive o uso de testosterona para tratar os diversos problemas relacionados à vida sexual das mulheres. Segundo a médica, “o papel deles é essencial à resposta sexual feminina, em especial: os androgênios, estrogênios, progesterona, prolactina, ocitocina, cortisol e feromônios, além de óxido nítrico, serotonina, dopamina, adrenalina, noradrenalina e opioides.”
Tratamento
Para o tratamento dessas disfunções hormonais, há vários medicamentos e entre eles está a reposição de testosterona. “Mas, antes de iniciar a terapia, é preciso que a paciente seja examinada por um médico. A consulta deverá contar com uma entrevista sobre a saúde dela em geral e sobre a vida sexual, além de um exame físico detalhado. A abordagem multiprofissional e multidisciplinar é a mais adequada”, ressalta Flávia. Na mulher, explica a ginecologista, os ovários e a conversão periférica dos pré-androgênios produzidos nas suprarrenais respondem pelos níveis de testosterona. Suas principais funções no organismo feminino envolvem a própria conversão em estrogênios, manutenção musculoesquelética, cardiovascular e ação em diversos centros cerebrais, inclusive aqueles ligados à função sexual. “A deficiência de testosterona nas mulheres tem implicações que podem contribuir de forma direta ou indireta para a diminuição do desejo sexual feminino”.
Um dos métodos de tratamento com testosterona é a aplicação vaginal que, ressalta Flávia, se mostrou eficaz para aumentar a espessura da mucosa e, consequentemente, reduzir a dor ou o desconforto durante o ato sexual. “O medicamento composto por undecanoato de testosterona adicionado à terapia hormonal convencional pós-menopausa melhorou significativamente a qualidade de vida das mulheres nessa fase. A testosterona transdérmica foi eficaz na melhora da diminuição do desejo sexual”, relata. Estudos realizados por especialistas indicam que o uso desse hormônio por período curto, de até 3 anos, é seguro. Mas existe a necessidade de estudos sobre reposição de testosterona em pacientes com falência ovariana prematura. A resposta terapêutica no emprego da testosterona em mulheres com redução do desejo sexual pode ocorrer após semanas de uso da mesma. Caso não haja resposta terapêutica em até seis meses, o uso da testosterona deve ser encerrado. “Como não há estudos sobre segurança do uso do hormônio por períodos longos em mulheres, diversas hipóteses são levantadas: riscos cardiovasculares vinculados a eventos tromboembólicos, hepatopatias e possibilidade do surgimento de alguns tipos de câncer”, informa. Flávia prossegue, “em relação ao risco oncológico, uma das maiores preocupações entre usuárias e médicos que optam pelo tratamento com testosterona, nenhum estudo conseguiu estabelecer vínculo real entre eles. Foram analisados os riscos para desenvolvimento de câncer de mama, de endométrio e de ovário e a testosterona transdérmica não se associou à elevação dos mesmos”. A associação entre elevação do risco cardiovascular e uso de testosterona também é foco de preocupação, estando, até o momento, estabelecida a relação do uso do hormônio com a elevação do hematócrito, que é a porcentagem de volume ocupada pelos glóbulos vermelhos ou hemácias no volume total de sangue. Os principais efeitos colaterais reconhecidos e associados à terapia com testosterona são a piora da acne e o hirsutismo (crescimento excessivo de pelos). “A conclusão que chegamos é que ainda não há respaldo científico que assegure a prescrição de testosterona por longos períodos. Existe benefício no uso de testosterona transdérmica para o favorecimento da resposta sexual de mulheres pós-menopausa, por período de até seis meses, desde que respeitadas às contraindicações para a administração de terapia hormonal; essas mulheres têm maior benefício quando têm vida sexual satisfatória no período pré-menopausa, pois daí, efetivamente, se verifica uma reconstrução da vida sexual de qualidade e há evidências de efeitos do uso de testosterona em diversos sistemas do organismo, inclusive mecanismos neurobiológicos. Logo sua prescrição deve ser extremamente cuidadosa e requer vigilância e acompanhamento multidisciplinar periódico”, conclui Flávia.