Pesquisadores da UFRGS e da Univasf identificam novo réptil fóssil de 230 milhões de anos no RS
Pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) identificaram uma nova espécie de réptil fóssil pré-histórico do interior do Rio Grande do Sul, que viveu há aproximadamente 237 milhões de anos, no Período Triássico (que durou entre 251 até 201 milhões de anos). A descoberta foi descrita em artigo publicado no periódico britânico Zoological Journal of the Linnean Society.
Batizada de Pagosvenator candelariensis, a nova espécie foi identificada a partir de um fóssil que consiste em um crânio e uma mandíbula quase completos, associados a algumas vértebras do pescoço e a algumas placas ósseas que cobriam seu dorso, similar aos dos crocodilos de hoje dia. O estudo também utilizou técnicas de tomografia computadorizada, a partir das quais os cientistas puderam ter acesso a muitas informações sobre a anatomia do crânio do animal sem danificar o material.
O fóssil em questão foi doado anonimamente para o Museu Municipal Aristides Carlos Rodrigues, no Município de Candelária, região centro-oeste do Estado do Rio Grande do Sul, no Natal de 2015, o que motivou o apelido carinhoso de “Papai Noel”. Após a finalização do estudo, o fóssil foi devolvido ao museu, onde encontra-se em exposição atualmente.
Conforme explica o líder da pesquisa Marcel Lacerda, que conduziu o trabalho durante seu doutorado no Programa de Pós-Graduação em Geociências da UFRGS, como, no momento da doação, não foram fornecidas maiores informações sobre o fóssil, não é possível saber com exatidão o local em que foi encontrado. A análise dos elementos químicos presentes no objeto, as características da espécie e o período de sua formação, entretanto, indicam que é bastante provável que o fóssil venha da região de Candelária.
O nome da nova espécie, aliás, é uma homenagem à importância desse município para a paleontologia. Pagosvenator candelariensis significa “o caçador da região de Candelária”. Pagos é um jargão gaúcho usado para se referir ao lugar de onde veio o material, derivado do latim pagus, que significa aldeia, região, província; e venator é um termo em latim que significa caçador.
Características
Segundo Lacerda, o Pasgosvenator era um animal de médio porte, com até três metros de comprimento, e, com base na comparação com outras espécies semelhantes já conhecidas, existe forte evidência de que seria um quadrúpede. Os dentes longos e recurvados indicam que o animal apresentava uma dieta carnívora, possivelmente baseada em pequenos e médios animais.
O professor de Paleontologia da Univasf Marco França, coautor do estudo, explica que o Pagosvenator pertence ao grande grupo dos arcossauros, que apresenta duas linhagens evolutivas: uma formada pelos ancestrais dos crocodilianos modernos e outra que inclui aves e dinossauros. “A nova espécie descrita não tem relação com as aves e os dinossauros, ela está na linhagem que deu origem aos crocodilos, embora ainda seja muito distante destes. Mais especificamente, o grupo em que o Pagosvenator se insere é denominado de Erpetosuchidae, sobre o qual, apesar de ser conhecido e estudado há muito tempo (desde o século XIX), não se possui muitas informações sobre a anatomia e as relações de parentesco entre seus componentes, já que é representado apenas por espécimes incompletos”, elucida França. Fósseis desse grupo foram encontrados na Europa, nos Estados Unidos, no leste da África e na Argentina. Pagosvenator é a primeira ocorrência desse grupo para o Triássico do Brasil.
Período Triássico
O Triássico é o primeiro período da Era Mesozoica e um importante momento na história da vida dos animais terrestres, porque é o intervalo temporal no qual surgiram os primeiros dinossauros, além dos ancestrais dos lagartos, dos crocodilos e dos mamíferos atuais. “Este trabalho é importante porque soma aos outros trabalhos na área que buscam compreender como era a região há 230 milhões de anos, no período Triássico”, afirma o professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia da UFRGS Cesar Schultz, que também participou da pesquisa. “Graças a estes estudos, hoje sabemos que os predadores desta época eram bem diversos. Vários deles, comoPagosvenator candelariensis, eram maiores que os dinossauros nessa época”, complementa França.
Como explica Lacerda, a descoberta amplia o conhecimento das espécies fósseis do Rio Grande do Sul e aumenta a compreensão dos processos evolutivos que levaram a diversidade de registros fósseis do estado. “Toda informação nova é útil para conseguirmos entender como eram o ambiente e a fauna daquela época. São informações que ajudam a contar a história da diversidade da vida daquele período”, enfatiza o pesquisador.
O trabalho foi realizado com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe).