A poluição atmosférica é uma fonte incontestável de redução de qualidade de vida, de adoecimento e mortes com impacto a níveis nacionais. Durante a 1ª Conferência Global sobre Poluição Atmosférica e Saúde, realizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no final de outubro, foram apresentados documentos e evidências científicas que comprovaram ainda mais o perigo. De acordo com a OMS, a poluição do ar é o principal fator ambiental que afeta a carga de doenças em escala global.
Para o assessor de Saúde e Ambiente da Fiocruz, Guilherme Franco Netto, o cenário global se encontra num quadro extremamente preocupante. “O que mais influencia no agravo da poluição do ar atualmente está concentrado na decorrência da enorme quantidade de veículos existentes no país, associada ao crescimento exponencial das grandes cidades onde a ocupação territorial desordenada e a má qualidade habitacional dominam”, pontuou. Dentro dos agravantes, está, especialmente, os desmatamentos de extensas áreas de florestas; ponto esse que, segundo Guilherme, o Brasil tem sido o principal contribuidor.
Cenário brasileiro
De acordo com o pesquisador, as recomendações da OMS de que os países adotem níveis mais restritivos de poluição foram essencialmente cumpridas pelos países do hemisfério norte e estão em níveis bastante razoáveis, mas há um alerta. “Passados 13 anos desta recomendação, a poluição do ar se encontra fortemente concentrada nos países do hemisfério sul, especialmente Asia, África e América Latina”. O assessor comentou sobre o cenário brasileiro nesse contexto, alegando que o país apresenta estatísticas que revelam a gravidade dos efeitos da poluição do ar na saúde da sua população. “As doenças do aparelho respiratório são a principal causa de internação hospitalar e a alta prevalência de asma e outras doenças e distúrbios do sistema respiratório são muito preocupantes. A isso se acresce contribuição da poluição do ar ao aumento da incidência de câncer entre nós”, afirmou.
Poluição do ar e prematuridade
As consequências podem ser observadas já no início da vida: a poluição do ar acaba sendo a verdadeira vilã para os neonatais. Um estudo conduzido pelo Instituto de Meio Ambiente de Estocolmo, na Universidade de York, relacionou os poluentes atmosféricos com 2,7 milhões de nascimentos prematuros por ano. De acordo com a especialista em neonatologia do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz) Cynthia Amaral, partículas finas no ar, derivadas do uso de óleo diesel, queimadas e outras fontes podem estar relacionadas aos riscos de partos prematuros em conjunto com outros fatores como a idade e saúde da mãe.
Em uma pesquisa sobre poluentes e gestação, pesquisadores brasileiros comprovaram, em camundongos, que a exposição à poluição durante a gravidez altera características da placenta e causa complicações no sistema que comanda a troca de substâncias entre o bebê e a mãe. Cynthia cita também o estudo Nascer no Brasil, da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz), especificando que a taxa de nascimentos prematuros corresponde a 35% de todos os nascimentos no país. De acordo com a especialista, existem vários estudos com resultados semelhantes e o problema persiste. Segundo estudos da Escola de Medicina da Universidade de Nova Iorque, a exposição à algumas partículas poluentes contribuem significativamente para o nascimento prematuro nos Estados Unidos.
Perspectivas futuras
Para Guilherme Franco, inúmeras são as alternativas possíveis para reduzir a poluição do ar no Brasil. “O país já fez um excelente dever de casa ao reduzir substantivamente as emissões geradas por fontes fixas (industriais) nas décadas passadas. Mas para que melhore, é essencial que o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aponte o melhor caminho para unir os esforços da sociedade brasileira, dos setores produtivos e de serviços geradores de emissões e os agentes do estado e dos governos, a fim de atingir a meta de viver em um país que tenha ar limpo”, pontuou.
O pesquisador também comentou a resolução recentemente aprovada pelo Conama que estabelece o prazo de 2030 para atingirmos as recomendações da OMS. “A resolução não explicita como, por quais mecanismos, seremos capazes de atingir um padrão de ar limpo, mas o estabelecimento deste ‘caminho’ é essencial para que os atores diretamente envolvidos sejam devidamente mobilizados e responsabilizados. O Brasil tem plenas condições de cumprir o objetivo de limpar o ar que respira”, concluiu.