Devon: De volta ao Castelo histórico onde tudo começou
Novos proprietários pretendem retomar a criação da raça Devon nos campos que receberam os primeiros exemplares no Brasil
A aquisição de um patrimônio histórico, no Sul do Rio Grande do Sul, remexeu em um baú de lembranças e trouxe grande expectativa quanto ao futuro do Castelo de Pedras Altas, em Pedras Altas (RS), a 400 quilômetros de Porto Alegre (RS).
De arquitetura medieval, a construção de 44 cômodos foi erguida no início do século 20 por Joaquim Francisco de Assis Brasil, importante personagem da política, cultura e agropecuária brasileira, que foi pioneiro em diversas frentes.
Em uma delas, trouxe para o Brasil os primeiros animais Devon, raça de gado que, segundo ele, “não poderia ser melhorada por nenhuma outra”. As planícies da propriedade receberam em 1906, o lote com as primeiras 40 novilhas Devon importadas do Uruguai, e impulsionaram a pecuária gaúcha da época. A expectativa dos novos proprietários é reconstituir o cenário do castelo de mais de 100 anos atrás.
“Vamos recuperar o castelo e reproduzir tudo como era. O galpão do Devon ainda está lá, a ideia é levar o Devon de volta e começar a criar também”, afirma Luiz Carlos Segat, pai dos novos proprietários, os irmãos Rafael, Gabriela e Kamilla Trindade Pacheco Segat, de Santa Maria (RS). “O Devon foi uma raça escolhida pelo próprio Assis Brasil, ele dizia que era muito importante utilizá-la para melhorar o rebanho da época, via um grande potencial no Devon e nós vamos mostrar isso para os visitantes”, completa Segat, presidente da recém-criada Associação Castelo de Pedras Altas, que lidera o projeto de reforma e restauração, junto com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (IPHAE).
O objetivo da família Segat é transformar a propriedade em um centro cultural, com dois dos quatro pavimentos abertos ao público. O visitante poderá conhecer, por exemplo, a sala, com móveis e todos os detalhes de onde foi assinado o acordo que deu fim à luta entre Chimangos e Maragatos, na Revolução de 1923, no chamado Pacto de Pedras Altas. A biblioteca, com 14 mil obras, abriga verdadeiras raridades na área jurídica, de sociologia, economia, agricultura, pecuária e muitas coleções. Oito livros foram publicados entre 1400 a 1500, antes mesmo do descobrimento do Brasil.
No acervo, pelo menos 105 obras tratam sobre a raça Devon. A mais antiga é uma publicação inglesa de 1884, em algumas o próprio Assis Brasil fez anotações escritas à mão. Também chamou a atenção dos novos proprietários uma caixa de madeira, com um torrão de terra trazido da Inglaterra, de onde se originou a raça Devon. A amostra é do local de onde foram importados novos touros para Pedras Altas. “Eu fiz um contexto da importância e magnitude do Assis Brasil e do castelo de Pedras Altas, o Devon está inserido nesse meio, como uma pedra preciosa”, resume Segat.
Tudo está identificado e tombado como patrimônio histórico. Segundo historiadores, Assis Brasil via na adaptabilidade a melhor característica da raça Devon. Os touros eram mantidos em meia estabulação, já as vacas viviam inteiramente a campo, tanto no inverno como no verão. Além de pioneiro do Devon, Assis Brasil importou ovelhas Karakul e Ideal, vacas Jersey, cavalos Árabes e, ainda, introduziu novas espécies de árvores, como o eucalipto. Também construiu estrebarias, galpões e porteiras que ainda estão na propriedade.
O patriarca da família Segat conta que o interesse inicial era por uma área rural, para agricultura e pecuária. “Nos deparamos com o castelo e toda aquela história, foi uma grande uma surpresa, acho que ainda não temos dimensão de toda a importância que ele tem”, pondera. O advogado conta que a receptividade está sendo extremamente positiva. “É surpreendente, estudiosos e pessoas que conheceram Assis Brasil nos procuram e revelam aspectos importantes sobre o pai do direito eleitoral, patrono da agricultura no Estado, liderança da revolução de 1923, proprietário da maior biblioteca familiar da América Latina e produtor rural de extrema relevância. E imagina a nossa família se tornar, agora, proprietária de tudo isso, essa expectativa nos gera uma responsabilidade social muito grande”, revela.
Luiz Carlos Segat assegura que “haverá muita coisa para ser vista e visitada. Vamos ter de volta o castelo e também a moradia, com gente, movimento e bagunça de criança”, diz, referindo-se à família e aos cinco netos. “Vamos devolver tudo isso ao Castelo”, projeta.
Para a presidente da Associação Brasileira de Criadores de Devon e Bravon, Simone Bianchini, a volta do Devon para os campos do Castelo de Pedras Altas terá um significado especial. “Assis Brasil foi um visionário que teve a feliz iniciativa de trazer a melhor raça de gado de corte para o Brasil. Foi a partir de Pedras Altas que o Devon tomou o rumo do Pampa, se espalhou por todo o Rio Grande do Sul, Santa Catarina e depois Brasil acima. Os criadores de Devon estão felizes e orgulhosos, a família Segat é muito bem- vinda”, ressalta a dirigente.