É comum as pessoas, principalmente as que possuem planos de saúde, consultarem médicos periodicamente e realizarem baterias de exames de rotina para checar se há algum problema de saúde a ser diagnosticado e prevenido.Muitas pessoas procuram médicos e médicas estimulados pela mídia, por amigos ou familiares, receosas de que possam ter uma doença e não sentirem nada. Essas pessoas costumam ficar aliviadas quando são bem examinadas.
A indicação é que há, sim, uns poucos exames a fazer e alguns cuidados a tomar visando uma vida com mais saúde, mas com muito menos exames e procedimentos invasivos e numerosos do esperado por elas. As informações são da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC).
As pessoas devem se sentir à vontade para procurar um médico se estiverem preocupadas com a saúde ou eventuais doenças; se quiserem saber sobre comportamentos que influenciem a saúde ou se, por alguma dúvida, quiserem ser examinadas. O problema é tentar convencer pessoas saudáveis de que elas devem frequentar médicos periodicamente para detectar doenças assintomáticas, e de que essa prática protegerá suas vidas da doença e da morte, não apenas em casos de check-ups ou quando há algum sintoma a ser investigado.
“Uma parte da população usa o check-up como uma oportunidade de colocar algum assunto que a preocupa – como medo de ter contraído HIV ou uma dor que ela teme ser câncer. Essas pessoas, se não têm demanda oculta identificada, podem acabar fazendo exames desnecessários, que provavelmente não terão a ver com o problema que tinham. Essas situações indicam que sempre que uma pessoa compareça ao consultório dizendo-se saudável e pedindo um check-up, o médico deve perguntar por que ela deseja isso e o que a motivou a buscar isso naquele momento.
Às vezes as pessoas dão pistas aos médicos que devem ser aproveitadas com perguntas mais fechadas, por exemplo ‘você está preocupado com alguma doença em especial?. Ainda assim, perguntas abertas, como ‘o que mais?’, devem ser preferidas, pelo menos inicialmente”, explica Antônio Modesto, médico de família e comunidade, membro da SBMFC.
Boa parte desses check-ups consiste em pacotes pré-definidos de acordo com sexo e faixa etária. Mesmo em consulta, muitos médicos pedem a mesma “bateria de exames” – costumeiramente ampla – para pessoas com características muito diferentes, sem análise de histórico pessoal. Nesse contexto, inúmeros exames são pedidos desnecessariamente, seja por inutilidade naquela pessoa, seja por sua inutilidade como exame de rastreamento em geral. Além disso, Modesto, que é doutor em Medicina Preventiva pela Universidade de São Paulo, explica que cada especialidade quer destaque para uma prevenção particular: os dermatologistas com o câncer de pele, os endocrinologistas com o câncer de tireoide, os cardiologistas com a hipertensão arterial, os cirurgiões cardíacos com o aneurisma de aorta. A pessoa passaria o ano indo a consultas mensais se atendesse a todos esses apelos.
Os exames de rotina a serem realizados devem ser avaliados e indicados pelo médico a partir de histórico do paciente, de acordo com a avaliação e acompanhamento periódico, que deve ser indicado pelo próprio profissional, com foco nascaracterísticas e expectativas de cada pessoa. “Exames mais universais incluem medida de pressão arterial anualmente a partir dos 18 anos; sorologia para HIV, sífilis e hepatites em pessoas que já tiveram relações desprotegidas; Papanicolaou a cada três anos a partir de 25 anos; mamografia a cada dois anos a partir dos 50 anos – aliás, mesmo a indicação da mamografia tem sido progressivamente questionada. Outras ações preventivas incluem vacinas para crianças, adolescentes e adultos; aconselhamento sobre não fumar e sobre usar preservativos; enfim, não apenas exames”, indica o médico de família.
A política de excessos na medicina, seja por realização de exames, seja por uso de medicamentos (vitamínicos, suplementos, entre outros), sem necessidade, é prejudicial em vários aspectos ao paciente. Um problema bem objetivo é que procedimentos desnecessários implicam em gastos desnecessários – seja para a pessoa ou para o governo, que, enfim, também é para todas as pessoas. Culturalmente, a medicalização acaba minando as estratégias de enfrentamento das pessoas, deixando-as dependentes do círculo profissional da saúde.
A indicação viável é sempre a conversa com o médico de confiança e discutir a necessidade da realização de exames ou caso haja indicação, o questionar sobre por que está realizando aquele procedimento e quais são as indicações científicas para tal e entender por que os exames estão sendo solicitados, como podem ajudá-lo e se há riscos envolvidos, inclusive de falsos-positivos. A boa relação médico-paciente é imprescindível para que todas as decisões sejam tomadas de comum acordo e evite ansiedade desnecessária, assim como custos efetivos sobre exames que poderiam ser evitados.