O fantasma de Sapiranga e o enigma do vice: Os desafios de Spolaor e Heliomar
POR JOÃO DARZONE – ADVOGADO E ESCRITOR
A corrida eleitoral para a prefeitura de São Leopoldo em 2024 já se desenha, com dois candidatos se destacando: Nelson Spolaor, do PT, e o Delegado Heliomar Franco. No entanto, o que deveria ser um momento de debate aprofundado sobre os rumos da cidade tem se revelado um verdadeiro vazio de ideias e propostas concretas.
Apesar de representarem campos políticos opostos, tanto Spolaor quanto Franco parecem mais preocupados em firmar alianças e distribuir cargos entre seus apoiadores do que em enfrentar os reais desafios de São Leopoldo.
Questões urgentes, como a gestão do lixo urbano, os altos valores do IPTU, a falta de segurança, contingências de defesa civil frente as mudanças climáticas, a morosidade nos processos de aprovação de obras, apresentação, planos de continuidade de obras públicas e a ausência de incentivos para os empreendimentos locais, têm sido completamente ignoradas pelos candidatos até o momento.
Essa postura é alarmante e demonstra um profundo descompasso entre as necessidades da população e as prioridades dos políticos. O comportamento tanto de Spolaor quanto Heliomar, não é de candidatos comprometidos com a busca de soluções efetivas para os problemas da cidade, e sim de meros jogadores de um tabuleiro eleitoral movido por interesses pessoais e partidários.
O desinteresse dos candidatos pelos temas relevantes para a cidade reflete uma tendência preocupante observada em todo o país. Segundo pesquisa realizada pelo instituto Ipec, 47% dos eleitores brasileiros preferem votar em candidatos que não sejam ligados nem ao presidente Lula nem ao ex-presidente Bolsonaro nas eleições municipais de 2024.
Esse dado revela uma profunda insatisfação com a polarização política e a falta de renovação nos quadros partidários.
Essa polarização ficou evidente nos resultados das eleições presidenciais em São Leopoldo, onde Jair Bolsonaro (PL) obteve 48,66% dos votos, contra 43,17% de Lula (PT). Nas eleições para o Senado, Hamilton Mourão (Republicanos) recebeu 44,59% dos votos, enquanto Olívio Dutra (PT) alcançou 39,45%.
Já na disputa pelo governo do estado no primeiro turno, Onyx Lorenzoni (PL) liderou com 40,06%, seguido por Edegar Pretto (PT) com 28,68% e Eduardo Leite (PSDB) com 24,90%, e culminou na volta de Eduardo Leite o terceiro nas pesquisas.
Em 2024, a insatisfação com a polarização política nacional também se reflete no âmbito local.
Esse equilíbrio de forças entre os campos políticos antagônicos torna ainda mais crucial a necessidade de um debate eleitoral focado nos reais desafios de São Leopoldo. Os candidatos à prefeitura não podem se dar ao luxo de ignorar as demandas da população em prol de disputas ideológicas estéreis.
Candidatos que consigam se apresentar como alternativas viáveis, com discursos moderados e focados nos reais desafios da cidade, podem surgir como surpresas eleitorais,”…
Ainda segundo a Pesquisa do Ipec Apenas 27% dizem preferir candidatos apoiados por Lula, enquanto 20% têm preferência por concorrentes apoiados por Bolsonaro. Esses números indicam que a população está cansada da divisão política e anseia por lideranças que se comprometam com as questões locais, independentemente de alinhamentos partidários nacionais.
No estado do Rio Grande do Sul, em ambientes altamente polarizados, são comuns grandes reviravoltas eleitorais. Casos como o de Germano Rigotto, que saltou de meros 5% diretamente para a cadeira do Piratini em 2002, e de Yeda Crusius em 2006 e Ivo Sartori em 2014, que repetiram o mesmo feito em situações de alta polarização, demonstram que o eleitor, farto do baixo nível dos debates na reta final da eleição, acaba migrando para o centro.
Esse fenômeno pode ser explicado pela psicologia eleitoral. Em momentos de intensa polarização, os eleitores tendem a se sentir desgastados e desmotivados com a falta de propostas concretas e o excesso de ataques mútuos entre os candidatos.
Nesse cenário, uma parcela significativa do eleitorado passa a buscar alternativas que representem uma espécie de “terceira via”, candidatos que se apresentem como moderados, equilibrados e focados em soluções práticas para os problemas da população. Essa migração de votos para o centro é uma forma de protesto contra a polarização excessiva e uma tentativa de encontrar um caminho mais construtivo para o debate político.
A postura vacilante de Heliomar Franco em apontar seu vice (que já foram simultaneamente quatro aliados conhecidos), ao mesmo tempo que aglutina e deixa assanhados os mesmos velhos caciques partidários (muitos dos quais da gestão fracassada de Moacir 2012/2016), cria inimizades pela falta de um comprometimento concreto com aliados, além de gerar disputas internas corroem a imagem de Heliomar como líder antes mesmo de começar a liderar.
Franco não apresenta nenhum projeto ou ideia que dê substância a qualquer aliança, querendo apoios por meros atos de fé em sua pessoa. Essa atitude pode afastar potenciais apoiadores e prejudicar sua campanha, uma vez que os eleitores buscam candidatos com propostas claras e consistentes.
Além disso, a escolha entre Nelson Spolaor e Nestor Schwertner para pré-candidato a prefeito pelo PT dividiu os filiados do partido. A diferença entre os dois se deu por meros 7 votos, revelando uma disputa acirrada.
No entanto, pela primeira vez em mais de 20 anos, o PT entra numa eleição dependente de seu maior aliado: o PDT. Esse partido goza de luz própria na gestão e, caso Spolaor vença e não consiga consolidar sua administração, o PDT pode, ao final de 2028, “chutar” o PT e o final, enterrar legado de Vanazzi, que é grande apenas no ego dele próprio.
Essa situação é agravada pelo “fantasma de Sapiranga”, pois, fato de Spolaor ter tido as contas reprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) em sua gestão em Sapiranga (Certidão do TCE 0469/2018, Of. DG nº6373/2018 – Proc. nº001184-02.00/09-4), acaba com a narrativa de bom gestor, além de enfrentar 5 ações judiciais movidas pelo Ministério Público Estadual e pelo município de Sapiranga (processos 50008804420178210132, 5000642-59.2016.8.21.0132, 5002750-90.2018.8.21.0132, 5001906-77.2017.8.21.0132 e 5002845-57.2017.8.21.0132).
Esses fatores podem pesar contra a candidatura de Spolaor e exigir um esforço extra para conquistar a confiança do eleitorado.
Em São Leopoldo, caso a polarização entre Nelson Spolaor e o Delegado Heliomar Franco se intensifique e o debate eleitoral continue esvaziado de propostas concretas, é possível que um cenário semelhante ao observado em outras eleições gaúchas se desenhe.
Candidatos que consigam se apresentar como alternativas viáveis, com discursos moderados e focados nos reais desafios da cidade, podem surgir como surpresas eleitorais, captando os votos dos eleitores descontentes com a polarização. Cabe aos candidatos e aos partidos políticos estarem atentos a essa dinâmica e buscarem construir campanhas que superem a lógica da divisão e se conectem com as necessidades e anseios da população leopoldense.
A mera distribuição de cargos e a formação de alianças sem um projeto consistente de governo podem se voltar contra os candidatos, afastando eleitores que anseiam por mudanças reais na cidade.
Spolaor, em particular, precisa enfrentar os questionamentos sobre sua gestão em Sapiranga e esclarecer as dúvidas levantadas pelas ações judiciais e pela reprovação de suas contas pelo TCE.
A transparência e a capacidade de apresentar soluções para os desafios enfrentados em sua administração anterior serão fundamentais para conquistar a confiança dos eleitores.
Neste ambiente de alta polarização, tal como ocorreu nas eleições de Germano Rigotto, Yeda Crusius e Ivo Sartori para o governo do estado, é possível que uma terceira via se beneficie e conquiste a prefeitura de São Leopoldo.
Quando os eleitores se encontram saturados com a divisão política e a falta de propostas concretas dos candidatos principais, eles tendem a buscar alternativas que representem uma mudança real e uma perspectiva de governança mais equilibrada e focada nos problemas da cidade.
Assim como Rigotto, Yeda e Sartori surgiram como opções viáveis em meio à polarização e conquistaram o Palácio Piratini, um cenário semelhante pode se desenhar em São Leopoldo. Um candidato que consiga se apresentar como uma liderança moderada, com um plano de governo sólido e propostas inovadoras, pode catalisar o apoio dos eleitores descontentes e despontar como uma surpresa eleitoral.
A polarização exacerbada entre os candidatos Heliomar Franco e Nelson Spolaor pode, no fim das contas, levar a um resultado inesperado, no qual um terceiro candidato, ainda desconhecido ou outro que esteja com pouco percentual, surja como a opção preferida dos eleitores leopoldenses no dia da votação, deixando tanto o delegado quanto o petista com a amarga sensação de “PERDEU, MANÉ!”, provando que em eleições, a definição só ocorre nas urnas.
Fonte: Gazeta do Povo. “Pesquisa Ipec: 47% dos eleitores não querem candidatos ligados a Lula ou Bolsonaro em 2024”. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/eleicoes/2024/pesquisa-ipec-eleicoes-2024-lula-bolsonaro/. Acesso em 28 de abril de 2024.