Rio Grande do SulSaúde

Cuidados necessários ao retornar para a casa após enchentes

Especialista aponta detalhes específicos do que deve ser avaliado nos ambientes após um alagamento

Nas enchentes que deixaram mais de 150 mortos no Rio Grande do Sul, o número de pessoas que estão temporariamente morando em abrigos no estado chegou a 80 mil (80.826), conforme o mais recente boletim da Defesa Civil estadual. Ainda que as águas dos rios e lagos envolvidos baixem, é preciso tomar muito cuidado no retorno para as casas, pois podem oferecer inúmeros riscos para a saúde e segurança dos moradores.

Publicidade

De acordo com o docente do curso Técnico em Segurança do Trabalho do Senac EAD, Roberto Mopert, todo o retorno ao lar após uma inundação requer muita atenção e uma série de cuidados específicos, pois os resíduos no local, a invasão da água e os impactos estruturais, emocionais e financeiros podem ser devastadores.

No caso de ambientes e casas rurais, o especialista destaca que pode haver contaminação devido a produtos químicos utilizados como agrotóxicos e possíveis contaminações devido à quantidade de animais mortos e em decomposição na água. Já no caso de ambientes e casas próximas a indústrias ou áreas comerciais, Mopert lembra que existem empresas que tem transformação e geração de energia elétrica, ferramentas que podem gerar lesões perfurocortantes, produtos químicos (tintas, gasolina, diesel, corrosivos), tanques, tonéis, botijões de gás, alimentos de origem vegetal e animal em decomposição na água, que geram gases tóxicos, asfixiantes e inflamáveis. “É de suma importância se ter todo o cuidado a esses perigos e riscos adicionais”, comenta.

Publicidade

Por se tratar de uma catástrofe de grande proporção, o docente ressalta que pontos como hospitais, esgotos, aterros sanitários, funerária e até mesmo cemitérios foram afetados. “Esses locais agravam ainda mais a preocupação sobre a contaminação na água, sem falarmos nas vítimas humanas e animais em decomposição. Após as águas baixarem e o retorno das pessoas aos seus lares ser autorizado ou não, inúmeros micro-organismos (vírus, bactérias, fungos e parasitas) estarão presentes no ambiente (no ar, no lodo, nos objetos, nas roupas, colchões, paredes, brinquedos, utensílios de cozinha, ou seja, em todo local)”.

Entre as doenças causadas pelos micro-organismos, o especialista cita diarreia, infecções intestinais, hepatite A, dermatites e infecções cutâneas (bacterianas e virais), tétano (tendo em vista que podem ocorrer perfurações com pontas de grades, arames, madeiras, pregos, telhas e utensílios domésticos), Doenças respiratórias (asma, Pneumonia e alergias respiratórias devido à exposição a mofos), doenças infecciosas (leptospirose e dengue), contaminação por produtos químicos presentes na água (domésticos ou industriais), que podem ser inalados, ingeridos ou absorvidos pelos poros da pele ou pela deficiência na higienização das mão, lesões ao bater em objetos escondidos pela água ou devido ao local estar deficiente de luz etc.

Nesse sentido, é importante seguir a recomendação dos órgãos oficiais: “Por mais que no momento nos pareça contraditório, é importante sempre seguir às orientações e determinações dos agentes de segurança pública e defesa civil envolvidos nessa emergência, pois na maioria dos casos eles têm informações que a população comum não tem. Antes de retornar à residência, é obrigatório se ter a liberação destes órgãos, pois, em meio a um retorno precoce, pode haver algum acidente de desmoronamento, soterramento, deslizamento ou até mesmo desabamento da residência, pois as inundações têm fortes correntezas e arrastam tudo pela frente”, ressalta.

O docente ainda elenca algumas perguntas de segurança a serem feitas antes do retorno, ainda que ele seja liberado oficialmente:

  • No bairro em que tenho minha casa, estão acontecendo saques e/ou assaltos? Se sim, preciso me expor a essa situação? Há policiamento ou a presença de agentes de segurança do estado?
  • O local está liberado para acessar? Se sim como farei o acesso? A pé? De carro? De barco? Preciso subir? Preciso descer? Preciso pular em algo? Se o ambiente mudar e houver um problema, como saio desse problema?
  • A casa está liberada para acessar. Ela foi inspecionada? Se sim, por quem? Era um profissional habilitado com experiência e conhecimento técnico?
  • Na minha casa ou bairro já tem energia elétrica? Se sim, a rua já foi liberada pela concessionária de distribuição de energia? Se tem energia e não foi liberada, existe a possibilidade de choque elétrico? Minha casa foi avaliada por algum profissional habilitado e qualificado na parte elétrica?
  • Já há pontos com água potável? Caso contrário, tem como me manter saudável lá? Como farei a higienização do local, minha alimentação e minha higiene pessoal?
  • Tenho condições físicas e mentais para retornar a minha casa? Ao retornar, como farei para me alimentar?
  • Tenho roupas secas? Onde farei a higienização das minhas roupas? Como farei para conciliar o retorno a minha casa com a minha própria sobrevivência?
  • Preciso usar medicamentos contínuos? Tenho esses medicamentos? Tenho como usá-los no momento certo?
  • No caso, por exemplo, de insulina, onde vou armazená-la? Como farei a aplicação da seringa e agulha? Farei isso num ambiente cheio de contaminação?
  • Tenho meios financeiros ou doação de utensílios e produtos químicos de higiene para fazer uma boa desinfecção na minha casa?
  • Tenho equipamentos de proteção individual, tais como luvas, máscaras, roupa impermeável, botas e óculos de proteção, para realizar esta higienização que será de certa forma intensa e irá me expor a muitos contaminantes, principalmente respiratórios e de absolvição pela pele? Lembrando que estarei exposto(a) a tudo o que tiver no ambiente, principalmente animais peçonhentos, por isso a importância dos equipamentos citados acima.
  • Após realizar a higienização, conseguirei ter um período de descanso com iluminação, ventilação e atenção?
  • Ao realizar a vistoria e a higienização de todos os cômodos, conseguirei ter uma detalhada inspeção visual na estrutura física de todos os cômodos, buscando rachaduras e possibilidades de colapso estrutural, assim como infiltrações e buracos?

Por fim, Mopert destaca que não se pode esquecer dos problemas que às vezes não se vê, não se externaliza, não se deixa evidenciar, por mais que seja evidente. “É preciso uma abordagem e uma avaliação urgente e contínua de profissionais da área da psicologia, psiquiatria e assistência social, pois tivemos incontáveis perdas materiais, humanas e de memórias, como fotos e pertences, que eram ricos em sentimentos fortes e, isso deve ser levado em consideração. O não tratamento precoce pode agravar distúrbios mentais já existentes, pode evidenciar os que só precisam de um gatilho ou desenvolver tardiamente problemas psicossomático em pessoas que não tem o costume de se expressar”, conclui.

Em caso de emergência quando for possível retornar para a casa depois das enchentes, o contato da Defesa Civil do estado do Rio Grande do Sul é 199.

Botão Voltar ao topo